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Ei, quantos times de nome Ferroviário ou Ferroviária você se lembra, assim, sem pesquisar? Vou-lhe dar um parágrafo para puxar pela memória.

Pronto? E aí, quantos? Se você costuma acompanhar o campeonato paulista, deve ter-se lembrado da Ferroviária de Araraquara. Se você joga loteria esportiva há muito tempo, provavelmente se lembrou do Ferroviário cearense – o querido Ferrim ou o temido Ferrão, dependendo da situação. Se você gosta de ler notícias sobre os campeonatos estaduais, talvez se lembre da Desportiva Ferroviária e do Operário Ferroviário.

Se você gosta de catálogos de escudos de clubes, possivelmente se lembre do Ferroviário de Recife, do de Serra Talhada (aí bate aquela dúvida se seriam um só) e, se tiver sorte (ou um mapa do Brasil), dos Ferroviários de Porto Velho e São Luís. Se você assistiu, nos anos 80, a uma matéria no Globo Esporte (ou Esporte Espetacular) sobre a situação de penúria que enfrentava o Ferroviário de Maceió, pode contar mais um. Ou seja, uns oito ou nove clubes, certo?

Pois bem, no livro Quando o futebol andava de trem: memória dos times ferroviários brasileiros, o publicitário e advogado Ernani Buchmann contabilizou nada menos que 82 times que tiveram ou têm “Ferroviário” ou “Ferroviária” no nome. Alguns deles você até já conhecia, mas esqueceu quando lhe perguntei. P.ex., o Ferroviário de Tubarão, o Pery Ferroviário, as Ferroviárias de Assis e Botucatu, o Ferroviário do Cabo e assim por diante. Mas você chegaria a 82 times?

Se não bastasse isso, ele também esmiuçou outros 51 times de origens ferroviárias, mas que não têm “Ferroviário” ou “Ferroviária” no nome. P.ex., o Nacional de São Paulo (antigo SPR, da São Paulo Railway), o Ituano (que já se chamou Ferroviário), o Paulista de Jundiaí, o Noroeste de Bauru, o América de São José do Rio Preto (o único América ferroviário), o Botafogo de Ribeirão Preto, o Valeriodoce, o ASA de Arapiraca e, é claro, o Trem, do Amapá (que, neste momento, apita na sua memória esportiva: “puxa, é mesmo, como fui me esquecer do Trem”).

Se você for exigente, certamente há de perguntar: tudo bem, esses são os times dos ferroviários, mas e os times do pessoal dos bondes? Ernani não os esqueceu. Estão lá o Tramway Cantareira de São Paulo, o Energia Circular de Salvador, o Sul América de Manaus e os Tramways de Recife e Fortaleza.

Detalhe: toda essa quantidade de times não está simplesmente relacionada, só nome, escudo e alguns dados sumários, como se fosse um catálogo, planilha ou banco de dados. Nada disso. O Ernani entrevistou inúmeras pessoas, muitas ligadas a esses clubes, além de pesquisadores do futebol e das ferrovias. Obteve, com isso, dados que você não encontra em livros, nem na internet, porque foram obtidos diretamente das fontes. São registros da história oral que, se não fossem por esse livro, provavelmente se perderiam em alguns anos.

Mas tudo bem, se você gosta de escudos, os que ele conseguiu estão publicados. E, se você gosta de datas de fundação, também. Informações preciosas misturadas a outras tantas, todas vazadas num estilo de crônica, texto agradável que se lê como literatura, sem o mofo acadêmico e sem a aridez da objetividade pura, dura e seca.

Só que, ao contrário do que se supõe a partir da enganosa informalidade estrutural das crônicas, o livro não é construído aleatoriamente. Ele tem uma rota muito clara: conduz o leitor-passageiro, do sul ao norte, estado por estado, seguindo uma imaginária viagem pelas linhas de trem. O autor-maquinista tem experiência, já que foi presidente do Paraná Clube, que tem origens em vários clubes, sendo dois com DNA ferroviário: Britânia e Ferroviário, do qual foi torcedor.

O único pecado a lamentar é que esse impecável livro só teve duas edições (2002 e 2004). Bem que uma nova tiragem podia sair da gare, com seu quilométrico comboio de informações sobre os times ferroviários do Brasil. Em bom mineirês, seria um “trem bom”!


Página adicionada em 22/Janeiro/2017.
Resenha do Livro "Quando o futebol andava de Trem", enviada por Laércio Becker.