Transcrição de parte da matéria da Revista Placar, de 10 de junho de 1988.
Nota: Partida realizada no domingo, 5 de junho de 1988Nenhum torcedor corinthiano com menos de 18 anos chegou a ver Rivelino brilhar com a camisa 10 alvinegra entre 1964 e 1974, Catorze anos depois, entretanto, o Reizinho do Parque voltou a vestir o mesmo uniforme e a emocionar a Fiel. Um garotinho, em especial, acompanhava todos os movimentos de seu ídolo de 42 anos. Era Rodrigo, 13, filho mais novo do próprio Rivelino.
Rodrigo e mais 15.000 corinthianos puderam torcer de perto para ídolos do passado, como o Zagueiro Olavo, o meio campo Carbone ou o ponta direita Cláudio - personagens das fabulosas histórias que os pais costumam contar sobre os grandes heróis do Corinthians e que os filhos nem acreditavam que fossem mesmo de carne e osso.
Campeões de 1977Todos tiveram a oportunidade, também, de relembrar conteporâneos de Rivelino, como o goleiro Ado, o zagueiro Ditão, o volante Tião e o centroavante Mirandinha. E ainda prestar uma homenagem a oito dos onze campeões da inesquecível final do Paulistão de 1977. Só Ruço, Luciano e Geraldão não apareceram. Vaguinho e Basílio, machucados, ficaram assistindo a tudo do lado de fora. Só que, mais uma vez, a genialidade de Sócrates roubou o espetáculo, como nos seis anos em que defendeu o clube.
Este encontro de várias gerações de craques corinthianos aconteceu domingo de manhã, no Pacaembu, em São Paulo. Com uma dose extra de emoção: do outro lado do campo estava o Corinthian-Casuals, time inglês que serviu de inspiração para um grupo de jovens fundar o Sport Club Corinthians Paulista no dia 1° de setembro de 1910.
A festa começou já no vestiário. Depois de muito tempo, os jogadores voltavam a se encontrar, Cláudio, por exemplo, demorou para reconhecer o atacante Milani. E olha que os dois atuaram juntos no Corinthians nos anos 40. O ex-zagueiro Domingos da Guia, 75 anos, o mais velho de todos, estava feliz em poder conhecer Rivelino e Sócrates pessoalmente. Mas não jogaria de jeito nenhum.
Escalação complicadaNinguém teve tempo de se aquecer. Rivelino aproveitou para combater o frio de 11 graus com um último cigarrinho na boca do túnel. Enquanto isso, Brandão, sempre escudado pelo preparador físico Hélio Maffia, tinha dificuldade para escolher os onze que começariam jogando.
Acho que vou escalar primeiro só os veteranos", pensou alto,
"Mas em cinco minutos estaremos perdendo de 5 x 0", desaconselhou Carbone, hoje no Guarani.
"Como é festa, eu peço para o juiz anular os cinco", riu Brandão.
O árbitro Dulcídio Vanderley Boschilia (foto acima) também foi parte integrante da histórica partida. Ao encontrar Cláudio, Olavo e Cabeção, brincou:
"Colecionei muita figurinha com a cara de vocês". Dulcídio entrou em campo como os juízes de antigamente - calça comprida branca, camisa amarela e tênis, que lhe custaram um belo tombo.
Como a maioria dos jogadores estava meio fora de forma, o jogo foi dividido em dois tempos de 25 minutos. Eram tantos veteranos do lado do Corinthians que o banco de reservas ficou superlotado. Todos queriam entrar e participar. Foram 26 substituições ao todo - dezessete da equipe paulista e nove dos ingleses. O resposável pelo sistema de som nunca trabalhou tanto. Anunciou a primeira substituição assim:
"Substituição no Corinthians". Depois percebeu que os dois times tinham o mesmo nome e passou a falar:
"Substituição na equipe paulista" ou
"no time inglês".
Cinco jogadores do esquadrão do Corinthians de todos os tempos, segundo a pesquisa de PLACAR em 1982, participaram da partida - Zé maria, Wladimir, Cláudio, Rivelino e Sócrates. Outros três (Domingos da Guia, Gilmar e Goiano) estiveram no Pacaembu para prestigiar os companheiros. No primeiro tempo, o goleiro Ado mostrou ainda muita elasticidade, enquanto o Super Zé esbanjou a mesma raça de sempre. Cláudio Christovam Pinho, 66 anos, o maior artilheiro do clube (295 gols), não aguentou muito tempo e foi o mais aplaudido ao deixar o gramado. O grande show, porém, ficou com os dribles mágicos de Rivellino e os toques magistrais de Sócrates, que marcou o único gol da partida, encobrindo sutilmente o goleiro Metcalfe.
"Nunca tomei um gol tão bonito", surpreendia-se.
"Esperava um chutão e..."Taça para o perdedorNo intervalo, Sócrates teve que posar para fotos junto dos ingleses, que levaram máquinas para dentro de campo. Faltando 15 minutos, Sócrates atendeu um pedido do Corinthian Casuals e trocou o fardamento branco pelo rosa e chocolate. Mais tarde, o Magrão ofereceria a sua camisa 8 para Jaqueline, a viúva de Sérgio Terpins.
"Fiquei torcendo para Rivelino e Sócrates se cansarem logo", confessava o técnico inglês Colin Humphreys. Os torcedores, por sua vez, imaginavam como seria bom se Sócrates e Rivelino tivessem jogado juntos. Possivelmente, o Corinthians não amargaria tantos anos de fila.
Terminada a partida, Maurice Coop, o octogenário presidente do Corinthian Casuals, recebeu um troféu e estranhou:
"Mas nós não perdemos?" Na verdade, o resultado de 1x0 pouco importou. Todos, jogadores e torcida, saíram alegres em poder ver os craques do passado e o "pai" do Corinthians.
"Foi uma festa incrível", elogiava Sócrates entre um autógrafo e outro para os próprios adversários, todos amadores que ainda pagam para jogar na Quarta Divisão da Liga Inglesa.
"Pena que não tenha dado tempo para matar toda a saudade". Para os corinthianos, no entanto, não poderia ter sido melhor.
Nota: O Corinthians Paulista jogou com Ado (Tobias), Zé Maria (Miranda), Olavo (Ditão, depois Amaral), Luis Carlos (Moisés, depois Guaraci) e Wladimir; Carbone (Tião, depois Tião Marino, depois Luís Antônio), Sócrates (Mirandinha, depois Ademir) e Rivelino; Cláudio (Bataglia, depois Ivan, depois Marco Antônio), Flávio (Geraldo José, depois Benê, depois Lance) e Lima (Romeu). Técnico: Oswaldo Brandão.